Aos 47 anos, Alex Salgado acumula uma bagagem de quase três décadas completas no mundo de telecomunicações. E um currículo com um forte DNA no B2B, ao liderar os negócios nesse segmento em passagens por MetroRED, Intelig e TIM.
Na Vivo, onde desembarcou em 2017, os primeiros anos não foram diferentes. A mudança veio, porém, em abril deste ano, quando ele foi nomeado COO e se tornou, na prática, o segundo nome na hierarquia da companhia, abaixo apenas do CEO Christian Gebara.
Salgado, que até então atuava como Chief Revenue Officer, passou a liderar as novas vice-presidências de B2B, B2C, Inovação e Novos Negócios, Engenharia e Serviços ao Cliente, e Tecnologia da Informação. E recebeu o mandato de estabelecer uma ligação importante entre todas essas áreas.
“Pegamos todo nosso time executivo e fizemos imersão em inteligência artificial e dados. De cima para baixo e para todas as nossas áreas. E para o time de tecnologia, comecei a explicar a estratégia e para onde queremos ir”, diz Salgado, ao NeoFeed. “Agora, quando colocamos um desafio na mesa, tenho os dois lados pensando cruzado.”
Essa não tem sido a única conexão estimulada por ele. Avaliada em R$ 108 bilhões, a Vivo segue em sua estratégia de ir além do mundo tradicional de telecom. E nesse percurso, um dos próximos passos é aproximar o portfólio de B2C da operadora do mundo do B2B, o ponto de partida de Salgado.
“Tem linhas que nós criamos para B2B e que, agora, vão começar a derivar também para a pessoa física”, diz o COO. “Quero levar o conhecimento que desenvolvemos para a pessoa jurídica ao B2C. E ver cada vez mais soluções de IoT aplicadas no dia a dia das pessoas.”
Na conversa, Salgado dá exemplos de como a Vivo planeja fazer essa transição. E fala ainda de temas como inteligência artificial (IA), de internet das coisas (IoT) de outras novidades nos dois portfólios e do apetite da empresa por M&As.
Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Por que essa reorganização anunciada recentemente pela Vivo?
Hoje, é impensável uma estratégia de negócios da Vivo que não passe por um vetor tecnológico. Os modelos de negócios vão ser remodelados a partir de uma visão de tecnologia e não dá para negar que a inteligência artificial (IA) vai mudar como fazemos os nossos negócios. E ter tecnologia integrada a negócio é vital para a nossa visão de futuro. Então, hoje eu venho cada vez mais incorporando tecnologia no dia a dia das áreas, até então, de negócios.
Como funcionava antes? Essas áreas não dialogavam?
Elas eram mais compartimentadas. Hoje, a área de negócio começa a falar de TI. E eu tenho uma área de tecnologia que também está sendo permeada pelas visões e estratégias de negócio.
Como isso tem sido feito na prática?
O primeiro passo é o letramento. Pegamos todo nosso time executivo e fizemos imersão em IA e dados. De cima para baixo e para todas as nossas áreas. Isso traz um ganho enorme, porque não tenho mais requisitos de tecnologia que não fazem sentido. E para o time de tecnologia, comecei a explicar a estratégia e para onde queremos ir. Então, agora, quando colocamos um desafio na mesa, tenho os dois lados pensando cruzado.
Já existe algum resultado prático dessa integração?
Já. O portfólio Lite, que lançamos em setembro, foi desenvolvido com esse conceito. É um plano anual, com assinatura. Você não tem o Netflix mensal ou anual no cartão? Por que meu produto não poderia ser equivalente? Então, criamos uma plataforma e usamos muita IA para codificar. Fizemos em quatro meses o que levaríamos 9, 10 meses para lançar.
Em que estágio está essa conexão com a tecnologia?
Hoje, todos os conteúdos e ferramentas de IA estão disponíveis para todos os funcionários. Todos têm acesso, por exemplo, ao Vivo GPT, que é uma instância interna do ChatGPT. Então, para criar um agente, a pessoa não precisa entender o workflow por trás. Está pronto. Ela vai lá e cria o agente para executar a função que ela quer. E eu tenho visto proliferar o uso desse tipo de plataforma em múltiplos cenários.
À parte do que está sendo feito dentro de casa, a Vivo olha a IA também sob a ótica de portfólio?
Estamos fazendo uma releitura de todas as aplicações tradicionais a partir da IA. Então, é como se eu estivesse indo para uma versão 5.0 das minhas aplicações.
“Estamos fazendo uma releitura de todas as aplicações tradicionais a partir da IA. É como se eu estivesse indo para uma versão 5.0 das minhas aplicações”
Há algum exemplo mais concreto nessa direção?
Temos, por exemplo, uma linha de IoT para o varejo, com câmeras de monitoria. E os algoritmos que estamos criando são muito mais eficientes. Eu consigo dizer se o planograma de uma loja está adequado ou não, sem precisar que uma pessoa vá até lá para verificar. Temos modelos de contagem de fluxo, de propensão. A câmera entende o que está acontecendo no PDV, se está havendo maior ou menor demanda. E já começamos a pilotar a medição da satisfação do cliente, de acordo com a sua fisionomia.
Desde quando e onde esse projeto está sendo pilotado? Há planos de escalar essa iniciativa?
Começamos há cerca de três meses, no nosso prédio em Alphaville e vamos subir nas nossas lojas na Berrini e no Morumbi. Hoje, somos um dos maiores varejistas do País, com 1,8 mil lojas. Então, vamos testar nessa rede antes de escalar, o que deve acontecer em dois, três meses. Rodou nessa operação, eu coloco na prateleira. E estamos usando esse mesmo conceito para as outras aplicações de IA.
Nesse espaço do B2B, que é o seu DNA, como a Vivo tem evoluído?
Em 2017, quando eu cheguei, a receita de serviços digitais do B2B não chegava a 5%. Ou seja, o B2B era puramente conectividade. E isso trazia um risco de sermos atacados e canibalizados. Então, decidimos montar plataformas de tecnologia em cima da nossa infraestrutura. Fizemos uma aposta muito forte em áreas como networking, segurança, cloud e IoT. Então, nós criamos um negócio praticamente do zero. E que, nos últimos 12 meses, já gerou uma receita de R$ 4,75 bilhões.
Qual é a estratégia para seguir crescendo nessa frente?
Eu vou sempre liderar em comunicação, que é o alicerce da minha operação. Em cima disso, ajudo o cliente a decidir onde colocar suas aplicações – na nuvem, no meu data center ou no dele. Depois, vou discutir aplicações. E aí, tenho aplicações verticalizadas, que entram muito mais no mundo de dados, de IA e de IoT.
Há algum setor que está puxando a demanda por essas aplicações?
Estamos fazendo muita infraestrutura e rede privativas para indústria 4.0. É o caso, por exemplo, do que temos feito com a Vale. Fomos a primeira empresa no Brasil a implementar uma rede privativa para automatizar plantas e portos. Estamos com um projeto grande no Porto de Tubarão, com uma infraestrutura de 5G, que vai ser capaz de fazer slicing e automatização de dispositivos de IoT usando a rede pública e um core privativo, para aplicações de missão crítica. E estamos levando essa mesma perspectiva para o campo.
O que tem sido feito nesse espaço?
Estamos crescendo muito na cobertura de IoT para o agronegócio e temos soluções de medição de clima, de solo, de aditivos, e de controle de aditivos. E tudo isso integrado na nossa plataforma de IoT. Tem muita solução que estamos colocando para todo o mercado. Um exemplo é o projeto com a Sabesp, que é o maior de IoT em saneamento no mundo.
“Quero levar o conhecimento que desenvolvemos para a pessoa jurídica ao B2C. E ver cada vez mais soluções de IoT aplicadas no dia a dia das pessoas”
O que é exatamente esse projeto?
Na primeira fase, que começa em dezembro, vão ser implementados 4,5 milhões de medidores na primeira fase em São Paulo e São José dos Campos. Além da medição e controle de água, vamos ter cobertura de conexão para todos os medidores, estejam eles onde estiverem. E, em cima disso, ofereço uma plataforma inteligente de monitoria. Hoje, São Paulo perde cerca de 30% da água no sistema por medição ineficiente ou por vazamentos. Imagina o impacto ambiental desse projeto. E, além do contrato com a Sabesp, isso me gera outro negócio.
Qual negócio?
Quantos condomínios em São Paulo têm a demanda de individualizar a medição de água e não são bem atendidos? Se eu tenho um produto, em escala, em que vou medir a água de todo o estado de São Paulo, eu posso medir o condomínio adequadamente com praticamente a mesma tecnologia. Então, eu vou fazer um spin-off desse produto no meu portfólio para atender a pessoa física na sua residência.
Quando isso vai começar a ser ofertado no mercado?
Provavelmente no primeiro trimestre de 2025. Então, tem linhas que nós criamos para B2B e que, agora, vão começar a derivar também para a pessoa física. Quero levar o conhecimento que desenvolvemos para a pessoa jurídica ao B2C. E ver cada vez mais soluções de IoT aplicadas no dia a dia das pessoas.
Quais segmentos estão nesse radar?
Eu quero crescer nesse portfólio de condomínios e casas inteligentes. Hoje, temos câmeras, monitoramento, mas há outros mercados que podemos acessar a partir dessa plataforma. E podemos entrar, eventualmente, no rastreamento de pets. É algo que pode trazer bastante oportunidade e que, hoje, não é trivial. Você tem dispositivos, mas se não tiver cobertura, não vai encontrar o seu pet. Eu gostaria de ter um tracking por GPS conectado na coleira.
Você pode citar outros exemplos que vão seguir esse percurso do B2B para o B2C?
A locação de equipamentos no B2B vai crescer para outros lugares. Hoje, fazemos muito microinformática e tablets. Isso vai crescer muito para smartphones e, se formos bem-sucedidos, pode ser que isso vire um produto também para pessoa física.
Falando especificamente de B2C, quais são as novidades e planos para a Vivo Pay?
Acabamos de lançar o consignado e vamos colocar agora nas lojas o buy now pay later, que é o financiamento do meu próprio produto. Aquele cliente que ia comprar um smartphone e não tinha acesso a crédito, eu vou dar o acesso através do Pay. Nós já concedemos cerca de R$ 1 bilhão em empréstimos e, agora que tiramos nossa licença de Sociedade de Crédito Direto (SCD), vamos acelerar bastante outros modelos de financiamento para nossos produtos.
Essa expansão do portfólio, seja no B2C ou no B2B, pode passar por aquisições?
Certamente. No B2C, por exemplo, criamos essa linha de casa inteligente e essa é uma das áreas que estamos avaliando como podemos ampliar, organicamente ou inorganicamente.
E no que diz respeito ao negócio tradicional da Vivo, de infraestrutura de telecom. No mercado se fala muito sobre consolidação e, no momento há conversas, por exemplo, entre a Claro e a Desktop, que já foi alvo da Vivo. Como a empresa está se posicionando nesse cenário?
Seguimos avaliando todos os ativos disponíveis. A grande discussão é o valor da aquisição. Tem uma base de clientes, uma rede construída versus a minha capacidade e velocidade de fazer isso de forma orgânica. O Brasil tem cerca de 90 milhões de domicílios. Nosso foco é chegar em 45 milhões. Hoje, estamos em 31 milhões. Ou seja, eu preciso crescer 50% da minha cobertura. Posso fazer isso de forma orgânica, com um valor X de investimento de rede mais um valor Y de captura desse cliente. Quando a gente soma essas variáveis, dá mais ou menos o valor que faz sentido pagar em uma companhia.
Mas qual é o apetite da Vivo por M&As nesse contexto?
Estamos sempre ativos. Se houver alguma oportunidade que se enquadre nesses nossos vetores de avaliação, que tenha uma sobreposição não muito grande e que faça sentido para a Vivo, podemos fazer esse movimento.
Fonte: NeoFeed
